Quando os filhos terão que assumir a propriedade!

A sucessão rural abrange mais que a transferência do patrimônio material – compreende também a difusão do patrimônio sócio cultural e histórico, que compreende o conhecimento guardado e transferido por gerações, a tradição local, os hábitos e demais características culturais.

Festas de final de ano, família reunida. Ambiente mais que favorável para discutir um problema existente á séculos: Sucessão Familiar. Que filho irá assumir a propriedade? Como trabalhar a situação? E como ficam os outros filhos?

Na Europa da Idade Média isso se resolveu por lei: o filho mais velho herda tudo e os demais tem que “se virar nos 30” – normalmente entrando para serviço público, exército ou igreja.

Nossa lei atual é diferente: todos tem direito a seu quinhão – mesmo que os pais sejam contra. Mas no meio rural vem a grande questão: os filhos querem viver da mesma forma que os pais?

Segundo os dados do IBGE, não. O chamado “êxodo rural” tem reduzido substancialmente, mas ainda é um movimento forte. Vários fatores transformam a vida na cidade mais atrativa que a vida rural – em especial para as mulheres.

Diversidade de profissões, possibilidade de melhor educação, a tranquilidade de um trabalho assalariado, as filhas mulheres serem pouco reconhecidas como possíveis sucessoras, e uma imerecida desmoralização da profissão de agricultor são apontados como agravantes. Outro grande problema é a rentabilidade na propriedade. Na Lapa, mais de 80% das famílias (rurais e urbanas) recebem menos de 2 salários mínimos mensais (IBGE 2010). Mas a maior parte das profissões que recebem mais que isso estão concentradas no meio urbano.

A questão é tão preocupante que várias entidades ligadas ao meio rural tem alguma ação ou acompanhamento sobre o tema. Um dos grandes pensadores do assunto, Francisco Vila, afirma que o problema é ver a sucessão como algo a se resolver quando os pais morrerem. Segundo ele, os melhores resultados surgem quando se mistura a energia e inovação dos jovens com a experiência e sabedoria dos mais velhos.

Ou seja, existem soluções e alternativas para melhorar os ganhos no meio rural e garantir um futuro para as novas geraçõs, mas para isso a família tem que estar disposta a apostar em mudanças – que nem sempre dão certo num primeiro momento. Contudo, é no entusiasmo dos jovens e na persistência dos mais velhos que se encontra o equilíbrio e soluções.

Família Zils, do Núcleo Leiteiro

A família já tem tradição no meio rural. O primeiro a exercer a atividade no Brasil foi o senhor Arthur Zils, falecido no último ano. Como muitos fizeram até pouco tempo, o sr. Arthur educou os filhos junto à lavoura desde cedo. Seu filho, Élcio Zils, teve suas primeiras experiências no campo a partir de seus quatro anos de idade.

Hoje, com 47 anos e produção focada na produção de grãos, o Sr. Elcio passa pelo novo desafio da sucessão, com seus três filhos – Jonas, de 20 anos, Natanael, de 18 anos e o pequeno Felipe, de 10 anos. Os dois mais velhos ainda estão decidindo que caminhos desejam trilhar, enquanto o pequeno ainda pensa apenas em brincar (e nisso ele está certo).

Jonas formou-se técnico agrícola, aqui na Lapa, e já está ajudando o pai. Pensa em fazer faculdade de agronomia, mas sem muito entusiasmo, pois crê que a formação que teve até agora está suficiente para auxiliar a família e prosperar. Já Natanael concluiu o segundo grau recentemente, e pensa em cursar Administração, naquela fase que todo jovem passa, decidindo seu futuro.

Família Zils em sua lavoura de soja. Da esquerda para a direita, o pai, Sr. Elcio, os jovens Jonas e Natanael e, e finalmente o pequeno Felipe. Família está na fase inicial da sucessão, onde os jovens ainda não decidiram totalmente o caminho que irão trilhar.

Família Krupa em Capão Bonito

A família do Sr. Cassimiro Krupa está em uma etapa um pouco mais avançada na sucessão rural, em comparação à família Zils. Isso porque os filhos já estão adultos e assumindo a produção.

A família já tem várias gerações no Brasil, e segundo o Sr. Cassimiro, já estão no meio rural pelo menos desde seu avô. A sucessão do seu pai para o sr. Cassimiro também seguiu o que existia – e ainda existe – na região. Um dos filhos ficou com a propriedade original, e os demais receberam apoio para adquirir suas próprias áreas. No caso do Sr. Cassimiro, seu pai financiava sua produção ou as vezes servia de fiador. Isso ajudou a comprar a primeira propriedade, em Antônio Olinto.

Em 1980 comprou a área no Capão Bonito, e como muitos agricultores, tentou várias produções: batata, leite, soja (inclusive arrendando terrenos de vizinhos).

Em 2007, produzindo pêssegos, descobriu os morangos, e começou a trabalhar com estufas. Seus filhos, Cristiano e Aldo, hoje com 37 e 35 anos foram incentivados desde cedo a acompanhar o pai.

Fizeram vários cursos, inclusive sobre sucessão rural, e hoje a propriedade é gerida praticamente como uma empresa, onde pai e filhos tem salario mensal, metas de produção e responsabilidades específicas. Na verdade, o Sr. Cassimiro conta brincando que agora seus filhos cuidam de tudo e ele fica responsável só por “puxar a orelha dos filhos” quando acha que estão fazendo algo errado. Que filho ficará com a propriedade? Serão sócios, pois no sistema de gestão atual, os conflitos ficam reduzidos e é possível partilhar a propriedade.

Família Krupa reunida. No centro o Sr. Cassimiro e sua esposa, Terezinha. À esquerda Cristiano com sua filha Helena, e à direita Aldo, que tem dois filhos- Vitor Hugo e Milena, mas que estavam na cidade, no momento da foto. Família já completou a sucessão, e filhos tocam os negócios, sob a supervisão do patriarca Cassimiro.

Sindicato Rural da Lapa

O Sindicato Rural talvez seja a entidade que mais incentiva o planejamento da sucessão rural. Através de sua parceria com a FAEP e SENAR, oferece cursos específicos na área, como o curso “Herdeiros do Campo”, que terá duas turmas em 2018. A intenção é que uma seja formada no Mato Preto e outra no Colégio Agrícola. Neste curso, além do treinamento especializado, as famílias dos alunos recebem visita de um especialista na área, que dá orientações com base nas especificidades de cada família.

Além disso, existem outros cursos que não são específicos na questão da sucessão, mas também abordam o tema, como o curso de “Empreendedor Rural”, com uma turma realizada agora em novembro e dezembro, e o curso “Jovem Agricultor Aprendiz”, também em andamento. Além disso, o programa Agrinho também trabalha bastante na área.

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