Não! A vaca não dá leite!

Sra. Edina Stabach ao lado de uma de um de seus animais - trabalho e dedicação na ampliação do rebanho.

Produção de leite entusiasma e desilude produtores, sendo apontada como grande demandadora de mão de obra e cuidados, mas louvada como atividade estável e de renda garantida.
Fonte de renda de diversos produtores de nosso município, a atividade leiteira – assim como tantas outras – tem suas particularidades. É uma das produções que mais demanda mão de obra no campo, mas também um das que garante maior estabilidade. Segundo o Sr. Ilson José Piovezan, sócio gerente da Naturalat, a produção leiteira “não deixa ninguém rico, mas também não deixa ninguém quebrar”, ao contrário de tantos outros exemplos no meio rural de culturas que entusiasmam os produtores, mas que cedo ou tarde provocam grande prejuízo.
A produção de leite tem uma certa sazonalidade. No período atual existe uma falta de leite no mercado nacional, e com isso os preços aos produtores melhoram. No verão, a tendência é oposta. Mesmo assim, se analisarmos a longo prazo, houveram alguns sustos nos últimos anos. Para o produtor, o ano de 2016 foi de comemoração, com preços altos e uma boa lucratividade. Já 2017 ocorreu o oposto, e o prejuízo foi generalizado. Este ano o preço está reagindo, mas ainda se aguarda o comportamento nos meses de verão, para saber qual será o impacto da sazonalidade.
Como a atividade demanda bastante trabalho, pois as vacas precisam ser ordenhadas em horários específicos – que muitas vezes não são equivalentes aos horários normais de trabalho, e também existe todo um cuidado com manutenção de pastagens, fornecimento de alimentação adequada para que o leite tenha melhor qualidade (e com isso melhor preço), cuidado com zoonoses, e assim por diante, quando se fala que “as vacas dão leite”, parece até uma piada de mau gosto. Não, o leite tem que ser produzido e colhido com muito sacrifício, daí o título desta matéria.
Produtor já a mais ou menos 25 anos, o Sr. Vanildo Krainski, ali de Capão Bonito, nos conta que não recomenda a outros produtores que entrem no negócio. Possui 12 vacas lactantes em uma área de 4 alqueires (mas admite que aproveita apenas parcialmente a área). Segundo ele, apesar de ser vantajoso do ponto de vista da renda constante e da possibilidade de manter a família com uma renda fixa, mesmo neste cenário de desemprego generalizado, considera que a atividade dá muito trabalho – trabalho este que não é remunerado como ele acredita que deveria ser. Conta que com a produção atual, se tiver que consultar um veterinário para tratar alguma doença, já estará no prejuízo. Neste ponto é bastante vantajoso aos produtores se vincularem a cooperativas ou empresas do ramo, pois algumas delas fornecem este tipo de serviço gratuitamente ou com custo reduzido. Outro ponto apontado é a necessidade de modernização, que ao mesmo tempo gera a necessidade de investimento, capital que as vezes o agricultor não possui, e reduz a necessidade de mão de obra. No caso do Sr. Vanildo, comenta que deseja canalizar a extração do leite, o que é uma tendência regional e vários produtores já adotaram. Com a tal canalização, o leite sai da ordenhadeira direto para um tanque de resfriamento, reduzindo também o contato humano, portanto reduzindo a possibilidade de contaminações e com isso garantindo a qualidade do leite.
Bem próxima ao Sr. Vanildo, encontramos a Sra. Edina Rychetski Stabach, que nos contou que tem a produção de leite no sangue. Segundo ela, cresceu em uma família que trabalhava com isso, e ao se casar com o Sr. João Paulo Pacheco Stabach, recebeu de seus familiares uma novilha prenhe. Logo que a mesma pariu, a Sra. Edina começou a usar seu leite para produzir queijos, que vendia na região. Aos poucos foi aumentando o seu rebanho, de inicio focando na produção de queijos do tipo purunguinho (queijo cozido). A procura era grande, mas existiam algumas dificuldades, pois para produzir este tipo de queijo precisa manusear o produto ainda quente, e com isso era comum escaldar as mãos. Também suas duas filhas pequenas exigiam atenção, e com isso teve que focar apenas na produção leiteira.
Mesmo reduzindo as atividades, ainda teve um histórico interessante. Até a sua oitava vaca leiteira, ela ainda tirava leite na mão, o que é bastante desgastante. Como a produção era pouca, entregava este leite para um vizinho, que vendia a uma cooperativa, e repassava a ela o valor entregue. Dai, a cerca de 10 anos, adquiriu sua primeira ordenhadeira, que era bem simples – apenas “balde e pé”, sem muitos complementos. Depois conseguiu adquirir um resfriador, e aos poucos foi melhorando seus equipamentos. Recorda-se do período que, mesmo com filhas pequenas, tinha que trabalhar na ordenha das 3 às 8 h da manhã, diariamente. Claro que o marido apoiou e incentivou, e seu falecido sogro também ajudou com a aquisição de algumas novilhas no início. Com tudo isso, hoje ela possui um rebanho de 90 vacas, sendo destas 55 em lactação e podemos dizer que é bastante entusiasta da área.
Os custos de se produzir um litro de leite são variáveis de acordo com a tecnologia, escala e sistema de manejo, mas via de regra se calcula que custa ao produtor R$ 1,10. As cooperativas e empresas integradoras costumam adquirir o leite a preços que variam de R$ 0,90 (sim, com prejuízo ao produtor) até R$ 1,30. Diferente do que se imagina, a escolha da empresa integradora por parte do produtor não depende diretamente do preço. O Sr. Ilson, da Naturalat, conta que a empresa está colhendo leite em locais distantes, a pedido de seu maior cliente, o Governo do Paraná, e se eles não recolhessem o leite nestas comunidades, a atividade local deixaria de existir. Então a disponibilidade da empresa em ir buscar é um dos fatores. A produção da Lapa é enviada até para locais como Londrina. Outro fator relevante é a confiança que a empresa/cooperativa transmite ao agricultor, e também serviços como assistência técnica, entre outros.
Existem várias empresas que recolhem leite em nosso município, e em alguns casos, o frete parece impactar bastante no preço final. Na Naturalat, nos informaram que isso se confirma, e os maiores custos da indústria estão em primeiro lugar no transporte, em seguida no custo da embalagem, e finalmente na mão de obra – que fica quase no mesmo nível da energia elétrica. Mesmo com preços variando de R$ 2,70 (leite de pacote) a R$ 5,00 (algumas marcas com embalagem tetrapack), a indústria não está tendo grande margem de lucro, sendo que inclusive em alguns períodos opera com prejuízo.
Ninguém nos lembrou disso, mas sabemos que toda essa cadeia produtiva tem um sócio oculto, o Governo Brasileiro, que deve embolsar em impostos muito mais que o produtor, a indústria e os supermercados juntos.
Além disso, a atuação governamental produz alguns problemas. A queda dos preços em 2017 é parcialmente atribuída a uma grande importação de leite em pó argentino. A recente greve dos caminhoneiros – de responsabilidade direta do governo – também teve seus impactos, apesar de que para os nossos entrevistados, de forma diferente em cada situação. No caso da Naturalat, como o seu produto é destinado a alimentação infantil em programas governamentais, os caminhoneiros se compadeceram e permitiram o trânsito, portanto, os impactos foram mínimos. A sra. Edina aproveitou sua habilidade e transformou todo o leite que ia ser perdido em queijo – o qual já vendeu quase todo. Já o sr. Vanildo perdeu entre mil e dois mil litros de leite.

Sr. Ilson Piovezan, sócio gerente da Naturalat – produção leiteira ‘não deixa ninguém rico, mas também não deixa ninguém quebrar’.
Sr. Vanildo Krainski no campo com seus animais. Renda garantida e manutenção de emprego, mas ao custo de grande esforço diário.
Sra. Edina Stabach ao lado de uma de um de seus animais – trabalho e dedicação na ampliação do rebanho.
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