Há algumas semanas, reproduzi no Bate Papo um texto escrito por Gustavo Ioschpe, economista e colunista da Revista Veja. Trata-se do artigo intitulado “Professores, acordem!”, publicado no referido periódico em sua edição de 14 de maio de 2014.
O texto, originalmente publicado por Veja, quando trazido pela Tribuna Regional, acabou por gerar polêmica entre a classe dos professores que, através de rede social (Facebook) demonstraram todo o seu descontentamento com relação ao conteúdo do artigo, bem como pelo fato de nós, Tribuna Regional, termos reproduzido tais ideias. Pois bem! Como vivemos em um país em que (ainda, graças a Deus) a liberdade de expressão é livre e necessária para a construção de um Estado Democrático, acredito que aqueles que realmente se consideram bons exemplos de professores (ou seja, que não “vestiram a carapuça”), não têm porque se preocupar com o conteúdo do artigo de Ioschpe. Afinal, o autor retrata aquele profissional engessado, que infelizmente tem uma “viseira” invisível em seu rosto e não sabe mudar o discurso sobre o problema da educação no país.
Nesta semana, a revista Veja, por coincidência ou não, em sua edição de 28 de maio de 2014, publicou texto de outro colunista, desta vez de Claudio de Moura Carvalho, também economista. E, também, sobre a questão da educação no país, sob o título “Mexíveis e imexíveis”.
Peço licença aos professores para, mais uma vez, atuar como “copista” (como foi dito por alguns nas redes sociais), e trazer este conteúdo aos leitores. Creio que é de grande importância trazer estes textos a nossos leitores que, muitas vezes, não têm acesso à citada revista de circulação nacional. E também creio que, de uma forma ou de outra, todos somos copistas (o professor, quando está transmitindo conteúdo a seus alunos, está criando conteúdo ou repassando o conteúdo? – vale a reflexão!).
Abaixo, então, o texto de Claudio de Moura Castro:
“’A escola é tão boa quanto seus professores’. Raras afirmativas encontram tanto consenso entre leigos, pesquisadores, ideólogos e agnósticos. Infelizmente, eles concordam por ser excessivamente vaga, cada um pondo suas próprias interpretações. Sendo eu um incurável pesquisador, vejamos o que dizem os estudos.
Primeiro, há que traduzir: professor bom é aquele cujos alunos aprendem mais. Portanto, o caminho das luzes consiste em perguntar que características dos professores estão associadas ao maior aprendizado dos alunos.
Seja no Brasil, seja alhures, sabemos o que não explica quanto os alunos aprendem: a experiência do professor, sua idade e nível de escolaridade — mesmo mestrado. Nada disso se correlaciona com a qualidade do ensino. Não posso deixar de tocar em um vespeiro zangado: o salário dos professores. As pesquisas tendem a mostrar ausência de associação com qualidade. Uma correlação simples, entre estados brasileiros, mostra que salários mais altos ou mais baixos não se associam ao Ideb de cada um. Mas essa assombração não é nosso tema.
O essencial em tais características é serem imexíveis. Não se pode mudar a idade do corpo de professores, sua formação prévia ou sua carreira acadêmica. Só com décadas isso se faz. No mundo da fantasia, o salário pode até dobrar. Mas quebram o Fisco os aumentos que melhorariam a qualidade.
Maurício M. Fernandes e Cláudio Ferraz (da USP e PUC-RJ) realizaram uma pesquisa econométrica muito cuidadosa, usando funções de produção para testar o impacto de várias características dos professores (http://www.econ.puc-rio. br/uploads/adm/trabalhos/files/td620.pdf). Com dados do Estado de São Paulo, buscaram testar o impacto de duas variáveis críticas sobre o ensino na 8ª série: 1) o domínio da matéria ensinada (usando as provas da Secretaria de Educação, aplicadas aos professores) e 2) as práticas adotadas em sala de aula. Ambas são “mexíveis”, pois é possível aperfeiçoar o conhecimento dos mestres e, ainda mais factível, melhorar suas técnicas de ensino.
Alvíssaras! Os resultados são memoráveis. Como em outros países, os professores que melhor dominam o assunto ensinado têm alunos que aprendem mais. Do ponto de vista estatístico, esse resultado é robusto.
Contudo, a análise demonstra que as práticas de sala de aula têm impacto bem maior do que o conhecimento da matéria. Ou seja, qualquer professor que adotar práticas hoje recomendadas terá alunos que vão aprender muito mais. São técnicas simples, que não requerem equipamentos nem malabarismos metodológicos. No caso, obtêm melhores resultados os professores que passam e corrigem o dever de casa, explicam a matéria até os alunos entenderem, mostram para que serve o aprendido e indicam livros de literatura.
Em pesquisas desse tipo, apenas se consegue medir dimensões relativamente simples do que acontece na sala de aula. Muita coisa importante fica de fora. Mas já é um grande avanço quando se logra desenhar uma pesquisa que associe resultados a medidas confiáveis dessas variáveis. E foi isso que fizeram os autores. Além disso, foram capazes de controlar estatisticamente — ou seja, manter constantes — variáveis que poderiam explicar diferenças de aprendizado. No caso, demonstrar que os resultados não se devem a amostras viciadas, a características do diretor ou ao que os alunos já sabiam, de séries anteriores.
O miolo das análises estatísticas é demasiado complicado para explicar em poucas palavras. Mas os resultados são perfeitamente compreensíveis. Mostram que, no caldeirão econométrico, as técnicas de sala de aula passaram à frente de todas as outras variáveis lá despejadas. E são práticas fáceis de aprender e adotar.
Portanto, a notícia não poderia ser mais bem-vinda. Trata-se de uma pesquisa brasileira, conduzida por autores de bom pedigree e cujos resultados são difíceis de ser contestados. Os procedimentos são de fácil incorporação em sala de aula e seu impacto é maior do que tudo o mais que conhecemos. Pode ser difícil convencer alguns professores a mudar suas práticas. Mas, pelo menos, isso está no campo do possível, em contraste com as alternativas imexíveis.”

