Indignação de sofá: quando a revolta termina na sala de casa

A política local parece ter se tornado um espetáculo digital. Basta uma notícia polêmica circular nas redes sociais para que uma enxurrada de comentários inflamados, sugestões mirabolantes e críticas ferozes tomem conta das telas. Mas quando chega a hora de transformar a indignação em ação, a realidade é outra: os assentos da Câmara Municipal seguem vazios, e os vereadores votam sem a pressão da população.

Foi o que aconteceu mais uma vez na Lapa. Enquanto centenas de cidadãos se manifestaram online sobre o aumento do número de cargos comissionados na prefeitura e a isenção do pedágio para moradores da Mariental, a participação presencial foi vergonhosa. Apenas 19 pessoas compareceram à sessão que definiria medidas com impacto direto no bolso dos contribuintes. Destas, quase metade eram visitantes frequentes ou servidores comissionados.

O caso do pedágio escancara essa contradição. Muitos se revoltaram nos comentários sobre a limitação das passagens gratuitas, apontando falhas e sugerindo alternativas. No entanto, na hora de fazer valer essas opiniões perante os vereadores, ninguém apareceu. Sem pressão popular, a proposta de ampliação da isenção foi rejeitada sem grandes dificuldades.

O mesmo ocorreu com o projeto que ampliou o número de cargos comissionados na prefeitura, um aumento que pode custar até R$ 14 milhões aos cofres públicos em quatro anos. Quando a notícia foi divulgada, o engajamento virtual foi intenso. Centenas de compartilhamentos e comentários mostraram indignação e preocupação com o inchaço da máquina pública. Mas, no plenário, onde a voz da população poderia ter feito diferença, o silêncio imperou.

É fácil criticar os políticos e dizer que nada muda, mas quantos estão dispostos a sair de casa para cobrar coerência e compromisso? A política não se faz apenas em postagens raivosas ou memes irônicos. Ela exige presença, participação e cobrança efetiva. De que adianta reclamar de decisões que foram tomadas sem resistência, se a oportunidade de interferir nelas foi ignorada?

A verdade incômoda é que a falta de participação da sociedade permite que os interesses políticos sigam seu curso sem barreiras. Se os vereadores percebem que os eleitores não fiscalizam seus votos, por que deveriam temer desagradar a população? No final, quem comparece e pressiona é quem acaba sendo ouvido.

Reclamar na internet pode ser catártico, mas é inútil sem ação concreta. Enquanto a população se limitar a protestos virtuais, as decisões continuarão sendo tomadas sem sua influência. A democracia não funciona no automático. Ela exige esforço, vigilância e, acima de tudo, presença.

A pergunta que fica é: até quando os cidadãos da Lapa – e de tantas outras cidades – continuarão delegando seu futuro a terceiros sem se dar ao trabalho de, ao menos, ocupar um assento na Câmara? Porque, sejamos sinceros, se não há participação ativa, não há direito de reclamar depois.

 

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Aramis José Gorniski


Entre em contato com Aramis José Gorniski: aramizinho@gmail.com