Sl 58 – Ainda que não substitua o texto em si, vamos à introdução, com vistas à interpretação e explicação contextualizada e atualizada, cristologicamente, dos Salmos, que têm em vista o conhecimento e a glória de Deus, em aroma suave, mediante Jesus Cristo. E nEle, na unidade do Espírito Santo, de fé em fé, edificação luteradora das consciências pávidas, exortação de soberbos e empedernidos, e consolo necessário, profícuo, ubérrimo dos corações atribulados.
O Salmo 58 é um Salmo de consolo contra os arrogantes pseudomest-res, que conduzem os seus ouvintes ao erro, irredutíveis. Eles, mesmo que exortados, tapam os ouvidos e não se deixam fazer ser sábios em Cristo. Senão, antes, irados, ameaçam de morte e querem devorar os piedosos, para os quais Cristo é importante. O salmista, salmodiando, se consola com cinco parábolas, crendo que não conseguirão levar a efeito o seu intento, em caráter último, porque Deus é Deus. Ele põe e porá limite de modo que eles não chegam até a metade do mal que querem fazer. Às vezes vem uma grande água e corre ruidosamente, como se quisesse varrer tudo; mas, agindo Deus, providente, ela passa sem provocar estragos. Um urso bravio é muito forte e ferroz; mas se a cerca, a armadilha, o laço o impedem e param, é ‘infrutífero’. Um caracol expoe os seus chifres, mas antes que ele possa chifrar, definha e morre. Uma criança, abortada expontaneamente, cuja gravidez não vingou, antes de ser parida, também aumenta o ventre da mãe, como se fosse nascer com vida, mas, se parida sem vida, sem vida está aí: não há como mudar o fato. Um arbusto espinhoso ‘bota’ muitos espinhos em seus galhos e dá a aparência de temor e que vai sagram muita gente, mas antes que fiquem duros e maduros, um machado ‘furioso’ o corta pela raiz, e todo ele é arrastado e lançado no forno, e ele, juntamente com seus espinhos, são transformados em cinzas. Os pseudomestres também planejam e intuem fazer grandes e elevadas coisas, mas os seus intentos, por intervenção divina, devem perecer, e nada do que queriam que sucedesse prospera, em caráter último, porque Deus é Deus.
O salmista, como reformador da Igreja uma, em seu salmodiar, é um censor fiel e verdadeiro porque quem quer instruir e consolar as consciências atribuladas, não pode pôr a perder a justificação por graça divina mediante a fé em Jesus Cristo. Juízes e profetas precisam falar e se orientar pelo que é veramente justo, ou seja, eles precisam reconduzir os ouvintes crentes do ministério da Palavra: da lei para a graça de Deus; de Moisés para Cristo. Pois, na aflição e nos conflitos da consciência, perdida a pura Palavra de Deus, o diabo costuma aterrorizar-nos e colocar diante de nós a consciência do pecado, a nossa péssima vida passada, a ira e o juízo de Deus, o inferno e a morte eterna, a fim de impelir-nos ao desespero, de subjugar-nos a ele e de separar-nos de Cristo. Se não sabemos distinguir entre as duas justiças – a da graça e a da lei –, se, aqui, não apreendemos a Cristo pela fé, que depois da ressuscitação e ascensão aos céus haveria de se assentar à direita de Deus, como a nossa vida e justiça, e que, também, haveria de intercede por nós, míseros pecadores, junto ao Pai, então estaríamos e continuaríamos sob a lei e não, sob a graça; e Cristo não seria o Salvador, mas legislador. E, então, já nenhuma salvação restaria, mas seguiriam, com certeza, desespero e morte eterna.
O salmodiado exorta a que aprendamos, diligentissimamente a distinguir entre justiça da graça e da lei, a fim de que saibamos até que ponto devemos obedecer à lei. A lei não deve exceder seus limites na pessoa que crê em Cristo, mas, apenas, deve ter seu domínio somente sobre a carne, a qual é sujeita a ela, e sob ela permanece. Onde isto acontece, a lei mantém-se dentro de seus limites, segundo Deus. Se, porém, ela quer ascender à consciência e dominar ali, vê que, então, sejas um bom dialético e que faças a distinção correta e não atribuas à lei mais do que lhe deve ser atribuído: ser um aio que conduz a Cristo.
O salmista salmodia de modo que cada membro do povo da Palavra e da fé continue testemunhando, como que a dizer: Na minha consciência, não reina a lei – duro tirano e carrasco cruel –, mas Cristo, o Filho de Deus, o Rei da paz e da justiça, o dulcíssimo Salvador e Mediador que conservará a consciência alegre e pacífica, na sã e pura doutrina do Evangelho e no conhecimento dessa justiça passiva: a da fé incomum.