No dia 15 de janeiro de 2011 completa um ano de falecimento do fundador da Tribuna Regional, Aramis Gorniski.
Em homenagem a ele, trazemos a você, leitor, um de seus Bate Papos Informais, publicado na edição 1378.
O tema continua atualíssimo. E Aramis Gorniski, de onde estiver, continua a contribuir para este pequeno Grande.
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“Dia destes ouvi um comentário numa rádio, daquelas que gostam de falar de programas de televisão, que aproximadamente 29 milhões de ligações do povo brasileiro votam em algum candidato para ser eliminado no paredão do Big Brother Brasil da Rede Globo.
Fiquei aqui matutando com meus botões… “é, nosso povo gosta de gastar, podes crer”.
Tentei anotar os dados que ouvi, preocupado. De acordo com o radialista, se formos colocar o preço da ligação do 0300 a R$ 0,30. Então, teremos R$ 8.700.000,00. Isso mesmo! Oito milhões e setecentos mil reais que o povo brasileiro gastou só nesse paredão. Suponhamos que a Rede Globo tenha feito um contrato “meio a meio” com a operadora do 0300, ou seja, ela embolsou R$ 4.350.000,00. Repito, somente em um único paredão.
Alguém poderia ficar indignado com a Rede Globo e a operadora de telefonia ao saber que as classes menos letradas e abastadas da sociedade, que ganham mal e trabalham o ano inteiro, ajudam a pagar o prêmio do vencedor e, claro, as contas dessas empresas.
Mas o “x” da questão, caro(a) leitor(a), não é esse.
É saber que paga-se para obter um entretenimento vazio, que em nada colabora para a formação e o conhecimento de quem dela desfruta; mostra só a ignorância da população, além da falta de cultura e até vocabulário básico dos participantes e, consequentemente, daqueles que só bebem nessa fonte.
Certa está a Rede Globo. O programa BBB dura cerca de três meses. Ou seja, o sábio público tem ainda várias chances de gastar quanto dinheiro quiser com as votações.
Aliás, algo muito natural para quem gasta mais de oito milhões numa só noite!
Coisa de país rico como o nosso, claro.
Nem a Unicef, quando faz o programa Criança Esperança com um forte cunho social, arrecada tanto dinheiro.
Vai ver deveriam bolar um “BBB Unicef”. Mas tenho dúvidas se daria audiência, por que na Inglaterra pensou-se em fazer um Big Brother só com gente inteligente, mas o projeto morreu na fase inicial, não teve audiência.
A razão foi que o nível das conversas diárias foi considerado muito alto, ou seja, o público não se interessou.
Engraçado que o cidadão vota para eliminar um bobão (ou uma bobona) qualquer, mas não lembra em quem votou na última eleição.
Que vota numa legenda política sem jamais ter lido o programa do partido, mas que gasta seu escasso salário num programa que acredita de extrema utilidade para o seu desenvolvimento pessoal e, que não perde um capítulo sequer do BBB para estar bem informado na hora de PAGAR pelo seu voto.
Que eleitor é esse? Depois não adianta dizer que político é ladrão, corrupto, safado etc. Quem os colocou lá? Claro, o mesmo eleitor do BBB.
Aí, aguente a vitória de um Severino não-sei-das-quantas para Presidente da Câmara dos Deputados e a cara de pau, digo, a grande idéia dele de colocar em votação um aumento salarial absurdo a ser pago pelo contribuinte.
E para que se preocupar com o Caixa Dois do PT se o eleitor tem condições financeiras de juntar R$ 8 milhões em uma única noite para se divertir (?!?!), ao invés de comprar um livro de literatura, filosofia ou de qualquer assunto relevante para melhorar a articulação e a autocrítica…
Chega de buscar explicações sociais, coloniais, educacionais; de culpar a elite, os políticos, o Congresso; de procurar desculpas quando a resposta está em nós mesmos.
Olhemos para o nosso próprio umbigo, ou o do Brasil.
A Rede Globo sabe muito bem disso, os autores das músicas Egüinha Pocotó, O Bonde do Tigrão e assemelhadas sabem muito bem disso; o Gugu e o Faustão também; os gurus e xamãs de auto-ajuda idem.
Não é maldade nem desabafo, é constatação.
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Pode ser difícil superar o vento, o frio e a falta de oxigênio, mas é muito mais difícil superar-se. (Waldemar Niclevicz)”
E, para completar o raciocínio, mais uma reflexão de autoria de Millôr Fernandes, a respeito do mesmo tema: “Fazia como o avestruz, para não ter conhecimento da realidade enfiava a cabeça na televisão.”