Haiti – o desafio continua

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   

Em 1994, uma força multinacional entrara no Haiti, com a aprovação do Conselho de Segurança da ONU, e restaurara Jean Bertrand Aristide ao poder. Dez anos depois, o esforço parecia ter sido insuficiente. Imperava o caos, refletido na reação instintiva de funcionários da ONU – “O Haiti novamente não! ” – quando tornou-se evidente que o País estava afundando rapidamente em direção ao caos e a ideia de nova intervenção internacional começava a ser discutida.

Em fevereiro de 2004, quando Aristide saiu, o País encontrava-se, sob todos os aspectos, nas mãos de bandos armados. Os haitianos estavam frustrados e desapontados com a comunidade internacional. Armamentos proliferavam e o tráfico de drogas ganhava apoio.

O pronunciamento de Kofi Annan, Secretário-Geral da ONU, de que “fazer corretamente agora seria fazer diferente do passado”, revelava que nada havia dado certo. O “diferente” do Senhor Annan subtendia a participação brasileira no comando das ações diplomáticas e militares. Nosso desafio era resolver problemas seculares, iniciados quando os franceses abandonaram os haitianos à própria sorte, agravados por ditaduras violentas, e não resolvidos por várias intervenções externas mal sucedidas.

Na condição de Adido Militar em Washington, participei das tratativas iniciais para a criação da Minustah, a Missão de Estabilização. A situação que se apresentava era assustadora. A Polícia Nacional do Haiti, responsável pela segurança pública, era mais virtual do que uma realidade. Suas ações violentas se igualavam às dos bandos armados.

Aos poucos, os brasileiros foram conquistando a confiança. Os haitianos passaram a nos olhar mais como parceiros do que intrusos com interesses hegemônicos. Após os sucessos iniciais, o Exército sentiu que precisava fazer mais do que apenas garantir a ordem. Em 2005, acompanhei nosso Comandante à ONU. Sua visita tinha por objetivo convencer da necessidade de levarmos para lá uma Companhia de Engenharia (autorização necessária, pois a ONU é responsável pela folha de pagamento dos militares). Foi essa Companhia que, construindo estradas, hospitais e escolas, deu novo alento ao povo haitiano.

As coisas caminhavam bem. A realização de eleições gerais havia sido uma importante conquista. No entanto, o terremoto do último dia 12 pôs tudo abaixo, levando, junto com milhares de haitianos, a vida da Dra Zilda Arns e de, por enquanto, quatorze dos nossos soldados.

Se em 2004 a situação era difícil, agora ela é trágica. Atender às necessidades elementares de centenas de milhares de desabrigados e famintos é um enorme desafio a ser enfrentado pela comunidade internacional. Neste contexto, cresce de importância a experiência acumulada pelos brasileiros que lá estão há cerca de seis anos. Espero que eles encontrem forças para ajudar ao sofrido povo haitiano a suplantar a tragédia que se abateu sobre ele.

 General da Reserva

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