Poste para presidente

Na entrada do que, há cinquenta anos, denominavam beco, hoje existe uma placa informando: “Rua Sem Saída”. O que era barro virou asfalto. Valetas foram canalizadas. Onde tinha mato,  hoje tem calçada. Quem era velho, morreu. Quem era criança, ficou velho. É o caso do Rinorceley. Rinorceley, como tantos brasileiros, carrega em seu nome a homenagem aos quatro avós (Ricardo, Norma, Ceci e Wanderley), transformada numa salada de letras de gosto duvidoso.

Ultimamente, ele tem deixado os vizinhos, da velha guarda como ele, preocupados. Foi flagrado dando bom-dia a um poste. Claro que não é um poste qualquer. Antes mesmo de o beco virar rua, ele estava lá. Portanto, é contemporâneo daquela geração de aposentados.

Toda sexta-feira, os remanescentes do ex-beco se reúnem para tomar umas biritas. Na última reunião, um deles resolveu abrir o jogo. “Amigo Rino (assim prefere, por razões óbvias, ser chamado o nosso personagem), estamos preocupadíssimos. Todo dia você  dá bom-dia ao poste”.

Antes que Rino pudesse esclarecer, o psicólogo (nessas horas, sempre aparece um) da turma resolveu teorizar: “Eu já tinha dito que, mais dia, menos dia, a vergonha por ter esse nome  iria, de alguma forma, se manifestar”.

“Seu bando de velhos!”, Rino não se conteve. “Vocês esqueceram que sempre fui um brincalhão, que sempre estive de bem com a vida? Pois saibam que, às vezes, é melhor dar bom-dia a um poste do ficar fuxicando como vocês! Além do mais, todos sabem que aquele poste está ali há muito tempo. Nos viu nascer, crescer e  progredir. Era ele que iluminava nosso caminho quando saíamos de madrugada para a escola. Quem de nós nunca quebrou sua lâmpada para dar uns amassos na Aninha? Ele viu todas as besteiras que fizemos e jamais nos dedurou. Sabe de tudo, mas não conta para ninguém. Ele não fala, e quem não fala não mente.”

Aí, foi a vez do político discursar: “Como  o poste não mente, poste para presidente! Se já elegemos uma vassoura, por que não um poste?” O corintiano (tem sempre um) não perdeu tempo: “Poste é fiel!” O marqueteiro (profissão da moda) inventou logo um bordão: “PPP, poste para presidente, tem luz própria e não mente!”

Lá pela enésima cerveja, os veteranos moradores daquela rua, que hoje é de classe média, já a tinham transformado num beco sem saída. Para arrematar, antes da “saideira”, decidiram que ela passaria a se chamar Brasil. Desde então, todos passaram a dar bom-dia ao poste.

() General da Reserva

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