Há tempos venho pensando em escrever sobre um tema que acredito ser deprimente. O prazer das pessoas em observar a desgraça alheia.
Não sei se há explicação lógica, ou psicológica, para tal fato. Mas, o que vem ao caso é que isso é constante. As pessoas estão sempre atrás de uma fofoca qualquer para passar o tempo.
Só que, na última semana, os “fofoqueiros” de plantão parecem ter se unido e vindo na redação da Tribuna, acreditando que temos a obrigação de divulgar fatos da vida particular nas páginas do semanário.
Há alguns dias, fui verificar os recados na página da internet do jornal. Eis que se encontrava por lá uma denúncia, grave, sobre uma pessoa da cidade. Verifiquei as informações e soube que não passava de mera intriga. Após a confirmação, deixei o assunto de lado, não aceitei a publicação da informação no site nem mesmo na edição da semana. Mas, para minha surpresa, um dia depois da circulação da edição, recebemos mais um recado, da mesma pessoa, questionando os motivos de não termos publicado nada sobre o assunto.
No mesmo instante me perguntei o que leva uma pessoa a querer ver a outra sendo julgada pela população, com seu nome manchado perante a opinião pública. Muitos querem utilizar a imprensa para decidir previamente um julgamento. Pode-se acusar as pessoas do que bem se entender, mas provar é outra etapa.
Neste ponto é pertinente falar, mesmo que brevemente, sobre o conceito de justiça, que é filosófico. Platão já dizia que “justiça é a felicidade do povo”. Kelsen, um dos maiores nomes da jusfilosofia de todos os tempos, chegou a conclusão de que não existe um conceito geral de justiça. Esta é individual. Assim, devemos ter um parâmetro, que é a lei. E, segundo a lei, não podemos divulgar fatos, acusar pessoas, antes que sejam julgadas.
O problema é que a população espera que a imprensa faça o papel da justiça, quando essa não é a sua função. A imprensa deve saber que o mais importante é combater o mal e, depois sim, ocupar-se da punição do mau.
O risco de confundir as funções entre jornalismo e justiça é de colocar o problema em cena, instigando a opinião pública. Não temos esta função.
Outro exemplo de notícia que pode instigar a opinião pública: notas policiais. Leitor, como vende-se jornais quando há algo trágico em sua capa! O que leva as pessoas a terem “sede” por desgraça?
Portanto, aproveito estas linhas para já deixar avisado aos leitores que buscam este tipo de informação nas páginas da Tribuna: essa não é nossa linha de jornalismo. Não procuramos sensacionalismo. Se você tem algo a denunciar, antes de mais nada, se identifique. Nós preservamos nossas fontes de informação.
E, para finalizar este Bate Papo, trago uma história que recebi do Momento Espírita e que serve de reflexão sobre o que colocamos como prioridade em nossa vida: a caridade ou o prazer na desgraça alheia.
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“Terminal de ônibus. Manhã de frio e neblina forte. Muitos se acotovelam, aguardando a condução que os haverá de conduzir ao trabalho ou à escola. Entre tantos, alguém chama a atenção da jovem que também aguarda.
É um menino de uns dez anos, não mais. Pele morena, blusa de lã, cabelos cortados rente. Olhos pequenos, infinitamente pretos, agitando-se nas órbitas.
Vez ou outra, de forma quase contínua, ele levava a mão esquerda à boca e ela percebia que ele estava cheirando cola. Era um viciado.
Tão pequeno, tão indefeso e penetrando já por vielas tão obscuras.
Poderia ser meu filho, pensou a jovem. Não fosse eu a mãe dedicada e que tem a possibilidade de deixar o próprio rebento aos cuidados de pessoa nobre, enquanto trabalho.
Poderia ser meu filho, continua a pensar ela. Não estivesse eu, aqui na Terra, ao lado do filho de minhas entranhas.
Poderia ser meu filho se eu não desfrutasse dos valores dignificantes que o cristianismo propõe e que repasso a cada dia, para meu filho.
Sentiu que as lágrimas lhe chegavam aos olhos. Onde estaria a mãe daquela criança? Saberia o que seu filho estava fazendo àquela hora da manhã?
Seu olhar encontrou o do pequeno, que logo desviou os seus dos olhos dela, incomodado.
Ela cedeu ao impulso e se aproximou. Ele se retraiu. Estranha cena. Ela estendeu a mão e lhe acariciou a face, depois a orelha.
Achegou-se bem perto e começou a lhe falar ao ouvido.
Falava tão baixo e de forma tão doce, que chamou a atenção do companheiro do garoto que também se aproximou, desejando ouvir.
Ela lhe falou dos perigos da droga, dos problemas que ela lhe causaria ao cérebro tão novo. Problemas para o restante da sua vida.
Depois foram palavras de afago, de ternura que brotaram daqueles lábios jovens. Palavras que lhes acenavam com esperança e reconforto.
Os meninos ouviram nos primeiros instantes. Depois se tornaram desconfiados e pulando a amurada, debandaram.
O carinho dela os havia afugentado. Pequenas aves assustadas, sem ninho. Acostumadas a pedradas, a olhares de reprovação e impiedade, não podiam imaginar que aquela pessoa falasse a verdade.
Assustaram-se como aves que fogem aos passos apressados dos caminhantes nas calçadas.
A jovem ainda ficou ali um tanto mais, acompanhando-os com o olhar, até os ver sumirem no mar da multidão.
Poderia ser meu filho, falou para si mesma, não estivesse ele protegido em meu lar, sob os afagos do carinho e os cuidados da maternidade e paternidade responsáveis.”
Enquanto prosseguimos nos digladiando em nome de ideias diferentes a respeito desse ou daquele ponto de vista, a morte ronda os passos dos filhos de ninguém.
Muitos deles não chegarão à juventude, porque têm a infância agredida e os anos roubados pela droga. Enquanto isso, o apelo de Jesus prossegue: Deixai que venham a mim os pequeninos, e não os impeçais… E qualquer dessas coisas que fizerdes a um desses pequeninos, a mim mesmo o fazeis…
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“A maior descoberta de minha geração é que qualquer ser humano pode mudar de vida, mudando de atitude”. (William James)