O País precisa de ampla reforma eleitoral

Todas as reformas até agora propostas e discutidas são importantes, todavia penso que a mais urgente de todas está passando despercebida: trata-se da reforma moral.

É o que tristemente se deduz de recente, séria e bem fundamentada pesquisa feita pela Fundação Getúlio Vargas que revela alguns dados realmente estarrecedores e preocupantes. O levantamento realizado em oito Estados de diferentes níveis socioeconômicos deixa bem claro que “a grande maioria dos brasileiros entende que a lei pode ser facilmente ignorada e que esse comportamento é generalizado”. Um quadro desanimador do trabalho revela que 81% dos brasileiros têm certeza de que é fácil transgredir as leis e levar vantagem sempre que desejar. Apenas 32% dos cidadãos confiam no Poder Judiciário e 33% na polícia. Os entrevistados disseram aos pesquisadores da FGV haver “poucos motivos para seguir as leis no Brasil”.

A análise do resultado da pesquisa leva à clara compreensão do sentimento dos cidadãos para fatores conhecidos e não combatidos. Em primeiro lugar está a certeza da impunidade, depois a desregrada e institucionalizada corrupção que começa nos altos escalões oficiais e desce a todos os patamares deixando as pessoas descrentes. A partir daí, ainda que intuitivamente, cada vez mais brasileiros se sentem tentados ou mesmo cometem delitos com a intenção de auferir pequenas vantagens em relação à grande corrupção que vê estampada diariamente nos noticiários.

Isto somente ocorre porque há quem os corrompa, evidentemente. A sedução é, muitas vezes, irresistível também pelas circunstâncias. Quando a oferta de propina em valor real vai muito além dos vencimentos de um funcionário, talvez em dificuldade econômica, fica difícil recusar, sobretudo quando sabe que se não aceitar outro aceitará. Acrescente-se a ainda o mau exemplo em toda a cadeia hierárquica com o agravante de que a impunidade é quase uma regra, tornando-se forte incentivo.

SEM CORRUPTOR NÃO HÁ CORRUPTO

Chegamos ao fundo do poço em termos de corrupção, porém existe esperança de subir à superfície e sair dessa situação. O alento vem da recente prisão (ainda que temporária) de diretores e executivos de grandes empresas, o que não deixa de ser um fato histórico e até sugere um pacto capaz de extirpar esta mancha: um pacto contra a propina.

É sabido que se existem corruptos é porque existem corruptores, estancando este lado o efeito nefasto tende a diminuir e até desaparecer.

Por tanto, é essencial que se denuncie e se puna também o corruptor e não apenas o corrupto. No momento em que não houver corrompedores não haverá, por lógica consequência, corrompidos.

REFORMA POLÍTICA

Por iniciativa de Dilma Rousseff o debate sobre a Reforma Política está retomado. É oportuno momento, a presidente tem novo período de governo e começa uma nova legislatura com o Congresso Nacional relativamente renovado, entidades da sociedade civil estão empenhadas, como a OAB que colhe assinaturas para apresentação de projeto de iniciativa popular. Tudo isso estimula ampla discussão e talvez possibilite pautar o projeto para 2015, que não é ano eleitoral que sempre emperra votações desse tipo de matéria. Ao tomar a iniciativa, o Executivo anima o Congresso Nacional que tem se omitido, pois há mais de 20 anos o tema está no Parlamento sistematicamente protelado.

É importante que a Reforma se fixe em pontos fundamentais que efetivamente venham a mudar o sistema fixando normas e parâmetros condizentes com o estágio das modernas sociedades democráticas. Tenho, por experiência política, firmes convicções sobre alguns aspectos pontuais:

a) Financiamento público de campanhas – Ponto essencial para o estabelecimento da real isonomia entre candidatos, permitindo que um concorrente de menores possibilidade econômica não tenha de enfrentar caciques políticos amparados por gordos financiamentos geralmente interesseiros; será uma forma de estimular o surgimento de novas representações políticas. Convém lembrar que tramita no STF ação impetrada pela OAB visando acabar com doações de empresas, é um passo, sem dúvida;

b) Coligações nas eleições proporcionais – É uma deformação no sistema eleitoral, os partidos fazem esdrúxulas coligações por interesses mesquinhos que acabam em resultados indesejáveis ao eleitor que pode votar em um candidato religioso de seu partido e eleger um ateu em partido coligado – é um exemplo. Ademais, alianças são definidas pelas cúpulas dos partidos sem afinidade ideológica e programática, pois são outros os interesses determinantes, daí se vê a cada eleição legendas antagônicas em um Estado perfeitamente aliadas em outros;

c) Votos – Discussão recorrente, sendo a tese mais consensual o estabelecimento do voto distrital misto, meio termo entre o sistema atual e o distrital puro. E tornaria menos dispendiosa a campanha do candidato distrital sem excluir o candidato com maior densidade eleitoral em todo o Estado. Outra opção é o voto em lista, onde o eleitor vota na chapa oficial  elaborada pelo partido e outro de livre escolha. A dúvida é quanto aos critérios para montagem da lista fechada;

d) Representatividade partidária – A Reforma é também a oportunidade para que os partidos se consolidem como siglas fortes e estrutura nacional. Uma forma disso é levar as siglas a uma razoável representação ou ao desparecimento, numa espécie de depuração natural. É a chamada cláusula de barreira que, evidentemente, encontra resistência entre os pequenos partidos, que preferem continuar existindo à sombra dos partidos maiores aos quais prestam vassalagem político-eleitoral. Seja com barreira ou não, o consenso é que há necessidade de se reduzir o número de siglas;

e) Reeleição e unificação – Embora tema secundário, a proposta de Reforma traz discussão sobre o fim da reeleição nos cargos majoritários e estabelecimento de mandato de cinco anos. Mais oportuno é que se aplique a coincidência de mandatos com a unificação das eleições gerais – presidente, governador, prefeito, senador, deputados federais e estaduais e vereador;

f) Diretórios, mandatos e comissões provisórias – Por fim, deve a Reforma normatizar o dispositivo que trata das Comissões Provisórias nos diretórios partidários, estabelecendo prazos definidos para realização de convenções livres e democráticas para escolha dos dirigentes e fixar tempo de mandato das comissões executivas. Como está, esse dispositivo proporciona intervenções arbitrárias pelas cúpulas mandatárias com poder para dissolver diretórios e instalar comissões provisórias que se tornam “permanentes”, o que efetivamente acaba com a democracia nos partidos.

Aos sinceros interessados na Reforma Política, o temor são aos caminhos. Já se cogitou de um plebiscito, referendo, ou os dois juntos, e ainda uma Assembleia Constituinte exclusiva, que no parecer de juristas constitucionalistas é impossível.

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