É hipocrisia que chama?

A alguns meses tive uma conversa com um cidadão que estava revoltado com os rumos que a humanidade está tomando na questão ambiental. Demorei a escrever este texto para não pegar briga, caso ele vier a ler, pois talvez nem lembre mais de tudo o que falamos.

Na ocasião estávamos em uma loja aqui da cidade, e começamos os três a conversar, ele, o lojista e eu. Bastante falante, ele estava horrorizado com o uso de agrotóxicos na agricultura, que – informava exaltado – são os responsáveis pelo aumento considerável no número de casos de câncer. O desmatamento – não só no Brasil – era um problema muito grave, segundo ele. Dei corda na conversa. Logo falou da necessidade da redução de lixo, porque estamos matando os oceanos. Aproveitei e perguntei se usava canudinho de plástico: ‘Nem morto’. Tudo muito lindo… no discurso, é claro.

Isso porque lá pelas tantas, o indivíduo sacou um maço de cigarros, e pediu licença. Saiu do estabelecimento em que estávamos e sem cerimônia acendeu deu profundas tragadas em seu cigarro, mantendo-se na porta do estabelecimento. Perguntei sobre sua saúde, e deslanchou citar os remédios que toma.

Terminado o cigarro, totalmente despreocupado, juntou o polegar e o dedo médio para o tradicional lançamento de bituca – na rua, é claro. Educado e sabedor da catinga típica dos adeptos ao tabagismo, sacou do bolso um drops de hortelã. Amassou a embalagem e antes de retornar à loja em que estávamos, jogou o lixo displicentemente na calçada.

Preferi não entrar em polêmicas no momento. Voltei ao assunto do desmatamento, e o cidadão começou a falar dos benefícios de termos árvores, que preserva as águas, que mantém os habitats para os animais, que temos que economizar papel para impedir o corte de árvores (me segurei para não o contradizê-lo na hora). Enfim, o manual da ecologia básica sabia ‘de cor e salteado’. Perguntei onde ele mora, e informou que reside bem próximo a mim, ali na avenida do monge.

Mais tarde, passei pela frente da casa dele, e não pude deixar de perceber que nem ele nem seus vizinhos tem árvores na rua. E isso num dos poucos trechos de rua da Lapa que a arborização seria perfeitamente possível. Árvores no quintal? Não dava para ver, mas na frente da casa nem mesmo gramado – tudo piso e concreto, então imagino que nos fundos também não teria nenhum ‘verdinho’. Provavelmente se eu questionasse ele iria dizer que árvores quebram calçadas, muros, soltam folhas, etc, etc, e devem ser plantadas na zona rural – cidade não é lugar.

Quando cheguei em casa não pude deixar de pensar sobre tudo. Este cidadão consciente e bem formado (sim, ele tem nível superior de ensino) é contra agrotóxicos porque ele acha que eles causam câncer, mas fuma e consome toda uma farmácia diariamente. Fala do lixo nos oceanos, mas não vê problema em jogar a bituca e o papel de bala na rua, desde que o canudinho – ah, esse vilão do canudinho – não seja mais utilizado. Propõe o fim do desmatamento por achar as árvores importantes, mas não planta nem mantém nenhuma em sua casa.

Fiquei imaginando se algum dia ele se aperceberia da hipocrisia de suas posições, mas é claro, se eu apontasse a situação, provavelmente criaria um inimigo. Mas pior mesmo é pensar que como ele, existem muitos ‘ambientalistas’ – só que não – como ele que se revoltam quando falo que os agrotóxicos não são tão problemáticos no Brasil, que o problema não é o desmatamento e sim a falta de plantio e/ou manejo de florestas, e que muito das campanhas ambientais atuais são só cortina de fumaça para ONG´s e políticos inescrupulosos, sem efeito prático? Acho que se eu levantar muito estas bandeiras, serei eu o vilão final da história…

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