Após a realização do “evento” do interrogatório do réu Luiz Inácio Lula da Silva, Mentor Neto publicou uma reflexão em sua página na rede social Facebook. Disse ele: “As coisas vão acontecendo e a gente não percebe. A gente embarca. Aos pouquinhos o nível do mar muda e a gente nem percebe. Lula conseguiu fazer o que faz desde os sindicatos. A mídia embarcou. O STF embarcou. A gente embarcou. De novo.
Evidente que seria impossível conseguir que a opinião pública ficasse a seu favor. Mas ele conseguiu coisa quase tão importante. Lula esperneou em todo canto. Na mídia, no STF, na ONU. Lula chamou Moro de juizeco. Disse que, no poder, é capaz de mandar prende-lo. Fez a militância se erguer em seu favor.
E conseguiu:
Reduziu a importância da Justiça para nivelar-se a ela. Se você duvida, pense nas capas das revistas dessa semana. Pense na mídia dizendo que Moro e Lula vão se confrontar. Que é o grande embate.
Do que estão todos falando? Estão malucos?
Moro é um juiz e Lula é o réu.
Não tem ‘embate’.
Não tem luta de ‘titãs’.
E nós embarcamos.
De novo.”
Não há reflexão mais lúcida sobre o “grande evento” da semana. Para um simples interrogatório, criou-se um espetáculo. Mobilizou-se a aparelhagem do Estado, para garantir a segurança pública, para garantir o acesso à Justiça Federal. Gastou-se dinheiro, mais uma vez, do contribuinte. Muitos tiveram sua rotina alterada e um dia a menos para fazer girar o seu negócio… O “mundo” parou para assistir como seria o momento em que Lula e Moro ficariam frente a frente.
Esquecem que depoimento e interrogatório são as coisas mais normais em processo judiciais. Tudo bem, trata-se de um ex-Presidente da República. No entanto, apesar disso, não passa de um cidadão como eu, como você – e assim deveria ser tratado. Não como um semideus. Ele é mais um réu prestando depoimento. Nada mais!
Sarkozy foi depor à Justiça francesa, chegou acompanhado de advogado e poucos assessores, e pronto! Um dia como outro qualquer! Mas, no Brasil… Ah! O Brasil!
Eugênio Bucci, em um artigo, faz referência ao bordão “rouba, mas faz”, que entrou para o folclore político brasileiro na década de 50 do século passado. Os cabos eleitorais do político paulista Adhemar de Barros (1901-1969) o repetiam para neutralizar os adversários, que o acusavam de ser ladrão. Em vez de negar as acusações, os adhemaristas afirmavam que Adhemar era um fazedor, que construía isso e mais aquilo. Se roubava? Isso era o de menos. O argumento era esdrúxulo, mas funcionava com uma boa parte do eleitorado, que também não ligava para aquele “detalhe” de roubar. Passados 60 anos continua a mesma coisa.