Corto cabelo e pinto

Ele não gostava nem um pouco quando os irmãos o chamavam de Quinzinho. Aos dezenove anos, voluntário, foi servir. Durante um ano, ficaria livre do apelido que detestava. Era agora o soldado número 512, Joaquim, da 2ª Bateria. Torcia para que os irmãos não fossem visitá-lo e revelassem aos seus companheiros aquela detestável alcunha.

Gostava de algumas coisas no quartel. De outras, nem tanto. Ter que cortar o cabelo toda semana era uma delas. A cada sete dias, sentava na cadeira do Valdevino. Em menos de cinco minutos, ele fazia o serviço. Tinha que ser rápido para dar conta da fila. Mas, o que tinha de ligeiro, ele tinha de ruim. Era barato. Por isso poucos reclamavam.

Quase no final do ano, Valdevino adoeceu. Era preciso substituí-lo. Consultaram a soldadesca para saber se havia alguém com prática no ofício. Como não apareceu ninguém, Joaquim resolveu arriscar. Levantou o braço.

Na manhã seguinte já estava empunhando uma tesoura e uma navalha. Entrou a primeira vítima. Era preciso caprichar. Levou vinte minutos, mas foi melhor que Valdevino, o que não era muito difícil. Na terceira semana, Joaquim já era craque. Para azar, seu e dos demais recrutas, Valdevino ficou bom e voltou.

Quando deu baixa, Joaquim, que nunca fora muito chegado às letras (Português não era seu forte), desistiu de estudar. Resolveu seguir a vocação: abriu uma barbearia. E não é que tinha mesmo jeito para a coisa? Além do mais, era bom de prosa, qualidade indispensável para um bom “fígaro”.

Os irmãos tentaram ajudá-lo. Mandaram fazer uma bela placa e a fixaram na porta do estabelecimento: “Quinzinho’s Barber Shop”. Ficou tão bonita (e ainda por cima em inglês), que ele nem ligou para o apelido. A clientela aumentou. Não cabia mais no salão.

Tudo ia bem, até que decidiu ampliar o negócio. Além de cortar, iria agora pintar cabelos. Para sua decepção, nenhum freguês entrou mais na barbearia. Não conseguia entender por quê.

Caro leitor: você entraria no “Quinzinho’s Barber Shop” ao ler este anúncio: “Corto cabelo e pinto”? Certamente não.

Moral da história: analfabetos funcionais, mesmo sendo profissionais sérios e competentes, acabam falindo. Mas, se forem famosos, são eleitos deputados federais. Tiririca é apenas um exemplo.

() General da Reserva

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