Uma chama que se apaga, uma história que se encerra

A Ferraria Metz encerra as atividades neste ano, depois de mais de cento e vinte anos de atuação na Lapa. É uma parte importante da história da cidade e mostra a importância das profissões ancestrais para o nosso progresso.

Algumas profissões vêm acompanhando a humanidade desde o início da civilização. Caçadores, agricultores, carpinteiros e ferreiros formam a base de tudo que conhecemos hoje.

A evolução que vivemos nos dias atuais nunca seria possível se não tivéssemos acesso aos artistas e artesãos que sabiam transformar os recursos naturais em objetos úteis.

A cidade da Lapa foi fundada em 1769, como um pouso para os tropeiros que faziam o caminho de Viamão, levando e trazendo seu gado na base do berrante e muito trabalho árduo.

Desde estes dias, uma das mais importantes profissões foi a de ferreiro, um artífice que transforma o duro metal nas mais diversas formas, sejam elas ferraduras para montarias, aros para rodas de carroças, correntes para os mais diversos trabalhos, todos estes itens e outros infindáveis tipos de ferramentas foram sempre de responsabilidade do conhecido ferreiro.

Uma arte nobre e árdua, onde o profissional aquece o metal a mais de mil graus de temperatura para poder dar a forma final, na base da força, com marretas, marteletes e muito músculo.

O FIM DE UMA ERA

Com o tempo veio o progresso e a industrialização, onde máquinas começaram a fazer o serviço do homem, fazendo a profissão de ferreiro deixar de ser imprescindível, sendo, cada vez mais, substituída por forjas industriais feitas em grande escala.

Neste ano de 2021 nos despedimos da última ferraria artesanal ainda em funcionamento na cidade, a conhecida Ferraria dos Metz, localizada na tradicional Avenida das Tropas, hoje conhecida como Avenida Manoel Pedro.

Com os olhos marejados de saudosismo, Seu Rogério Metz, atual proprietário, conta que a empresa foi criada por seu avô, Ricardo Metz, no início do século passado, lá pela virada de 1800 para 1900. A empresa passou depois de muitos anos para o controle do pai do Seu Rogério, senhor Evaldo Metz, o Dino e, finalmente, quarenta anos atrás, ele assumiu a direção do empreendimento, onde atua até hoje.

Questionado acerca do futuro da profissão, seu Rogério fala que seus filhos não quiseram seguir a profissão, devido à falta de demanda no trabalho. Durante muitos anos os filhos Rogério e Vanderlei Metz trabalharam junto com ele, mas as novas gerações não têm interesse nesta arte.

A industrialização e fabricação de peças de aço em escala comercial acabou tornando inviável a continuidade do trabalho artesanal neste estabelecimento centenário e Seu Rogério, falou do seu trabalho à frente do árduo trabalho de ferreiro.

Segundo ele, era comum ter muito movimento e clientela, sempre em busca de um acessório especial feito em aço, moldado sob medida, o qual era produzido através da força de máquinas artesanais e uso dos músculos para finalizar.

Carroças, acessórios para fazendas, arados, armações metálicas de grande porte, estruturas para suporte de qualquer tipo, tudo isso era feito peça a peça, martelada a martelada.

Próximo à Ferraria dos Metz, há uma fábrica de carroças, de propriedade da família Deichmann, e o trabalho para a construção destes veículos era feito praticamente em parceria. Enquanto os Deichmann faziam a parte de marcenaria, também artesanal, os Metz cuidavam das partes metálicas da estrutura e no fim, uma carroça zero quilômetro estava pronta.

UMA HISTÓRIA

Ao acender a forja para nossa reportagem, seu Rogério olhava longe enquanto falava, lembrando dos tempos de ouro do negócio, onde a arte e capacidade manual e artística era muito necessária.

Assim como tudo em nossa civilização, o trabalho árduo destes profissionais, em especial a família Metz, merece o nosso mais sincero reconhecimento e registro, pois foram eles que nos fizeram chegar onde chegamos.

Para você entender a complexidade e técnica do trabalho de um ferreiro, Seu Rogério pediu ao seu funcionário para fazer um elo de corrente. Primeiro pega-se uma barra de ferro na largura pretendida e coloca-se está na forja, até que ela atinja a temperatura de moldagem. Neste momento o ferro chega a brilhar em vermelho e branco, tamanho o calor necessário, mais de 1.200 graus centígrados. A partir disso, com um alicate especial, o ferreiro coloca esta peça ainda quente na bigorna, que é um imenso pedaço de metal usado como base, e o trabalho de moldagem começa. Usando marretas e muito músculo molda-se um lado da barra de ferro, fazendo quase que um gancho, em seguida o outro lado que ainda está reto é colocado na forja e repete-se o mesmo processo. Isso tudo, em condições normais, leva aproximados 10 minutos e, finalizada a moldagem, está pronto um elo de corrente. A cada elo, o processo é repetido, até ter o comprimento ideal para o uso.

UMA CHAMA QUE SE APAGA

A empresa vai encerrar atividades devido à evolução nos processos de produção em massa de peças de ferro e aço, tornando inviável a continuidade do trabalho, mas o registro histórico da importância deste trabalho deve ser guardado, para sempre, no coração dos lapeanos. Foram homens como estes que construíram tudo que temos hoje de facilidades, mas normalmente não recebem o mais simples reconhecimento.

MUSEU

A estrutura da oficina está sendo desmontada e será reativada em breve, na residência do Seu Rogério em forma de museu, para mostrar às novas gerações o árduo caminho que trilhamos para chegar até aqui. 

Uma foto nostálgica, funcionários trabalhando na Ferraria Metz.
Seu Rogério Metz e o funcionário Marcos.
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