A última geração a roubar mimosas

Nos idos da década de 80 nos reuníamos nas ruas de terra batida da Vila Santa Zélia para as nossas aventuras infantis. Fazíamos carrinhos de rolamento que precisavam lubrificação especial para rodar na terra (não podia ter graxa nenhuma, era água mesmo prá rodar). Inventávamos campeonatos de estilingue e até batalhas contra as crianças das outras ruas e vilas. Juntávamos o time e batíamos uma bola no campinho da XV, atrás da Escola Manoel Pedro e, quando o time estava perdendo, o dono da bola ia embora e o jogo acabava.

Bullyng a gente resolvia no tapa e ai de quem chegasse em casa machucado. Apanhava do pai ou da mãe ainda mais. O tempo passava leve e os dias pareciam cheios de possibilidades.

Mas o que mais gostávamos era da época de geada e das mimoseiras que existiam nos arredores.

Aqui ao lado da Tribuna Regional morava o “Nho” Dito Santos, que tinha em sua propriedade uma mini chácara. Cabritos, galinhas, horta e tudo o mais. Mas o melhor era a mimoseira que ficava no lado da cerca, ao alcance das mãos ávidas e afoitas das crianças da vila.

Como eram deliciosas as tardes de ‘roubar mimosa’. Saíamos de casa falando para as mães que não iríamos aprontar e já íamos para os terrenos vizinhos, dar o nosso jeito.

Como ninguém levava sacola, quem sofria eram as camisetas e blusas que usávamos. Fazíamos de sacola e dá-lhe roubar mimosa. Tempos bons.

“Nho” Dito brigava com a criançada se os via pulando a cerca, mas era apenas um jeito divertido dele de botar medo nos ‘pequenos meliantes’. E, por medo ou despeito, lá íamos nós novamente roubar mimosas no terreno dele.

Não era só ali que havia uma bela mimoseira. Na Avenida do Monge havia um depósito de areia e brita do “Seo” Celso Linhares, bem próximo à esquina da AABB. Ali era um sonho. Mimosas deliciosas, jaboticabas docinhas e muito espaço num pequeno bosque para invenções e aventuras que criávamos. O único problema era entrar lá. Não era tarefa fácil. Precisávamos atravessar três ou quatro quintais para chegar ao tão esperado destino. E, do mesmo jeito que o “Nho” Dito, “Seu” Celso também assustava a criançada, mas se divertia com a folia toda.

O terreno do “Seu” Celso foi dividido, casas construídas e muitas daquelas árvores não existem mais, enquanto o lote do “Nho” Dito mantinha apenas aquela mimoseira saudosa. Hoje não existe mais a dita cuja, que foi cortada para aplainar o terreno, mas a memória daqueles dias não deixa as lembranças daqueles que tiveram a oportunidade de participar das aventuras.

As coisas mudam, o tempo passa. O que fica é o laço de amizade que criamos naqueles dias inocentes e as memórias dos grandes desafios a que nos propúnhamos.

Entre rolimãs, mimosas, cetras e bate-bola uma geração se criou e cresceu. Hoje a maioria daquelas crianças arrumou seu espaço no mercado de trabalho, valorizando suas habilidades e lembra com saudades das mimoseiras de infância, onde tudo era permitido e o sonho era infinito.

Fica o registro de um tempo em que as travessuras eram aventuras e que as crianças viviam em grupo. Os meus contemporâneos podem afirmar que somos a última geração a ter roubado mimosas neste mundo.

Bons tempos.

 

 

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Aramis José Gorniski


Entre em contato com Aramis José Gorniski: aramizinho@gmail.com