Aprovação compulsória

No ano passado comentei aqui sobre uma orientação enviada para os professores de sexto a nono ano, e também de ensino médio, elaborada pela Secretaria Estadual de Educação, que informava detalhes sobre o conselho de classe.

O tal conselho de classe é uma invenção recente. Até o final dos anos 90, o aluno era avaliado durante o ano, e caso não atingisse a média mínima (sete pontos), era convocado para realizar uma prova final – com conteúdo de todo o ano. Era a chamada “recuperação terapêutica”. Confesso que até hoje não entendi o que tinha de “terapêutica”, mas o fato é que os alunos se esforçavam para não ficar na recuperação, pois acabariam tendo uma quantidade muito grande de matéria para estudar.

No começo dos anos 2000 as coisas foram mudando. A média já baixou para 6 pontos, lá em 1995, e aos poucos o ensino como era foi demolido. Claro, a intenção era criar algo melhor. Mas os índices de educação mostram que a coisa não saiu como se esperava.

O sistema hoje obriga o professor a disponibilizar pelo menos duas formas de avaliação, com duas recuperações logo em seguida. Em várias instituições da Lapa optou-se por três avaliações, com três recuperações. O primeiro efeito disso é que para se obter nota ficou muito mais fácil. E friso: para obter nota. Não estou falando em aprendizagem, pois para o aluno que realmente aprendeu é indiferente ser avaliado em uma, duas ou três etapas. O segundo efeito é a redução do número de aulas, pois entre cada prova e recuperação é necessário ministrar uma revisão, e com isso no mínimo oito aulas são dedicadas apenas ao processo avaliativo (isso onde se aplica apenas duas avaliações). Para disciplinas que tem apenas duas aulas na semana, isso faz com que se reduza em muito o conteúdo.

Mas tudo bem. Mesmo com nota reduzida para seis e toda a facilidade durante o ano para obter notas, ainda se criou a figura do conselho de classe que basicamente deve avaliar se o aluno tem condições mínimas de progredir para nova série.

Algumas escolas até ano passado tomavam algumas medidas de corte, como por exemplo, se um aluno não atingir média mínima de 4 pontos em qualquer disciplina, ou se não atingiu nota mínima de 6 pontos em mais de 3 disciplinas, seria reprovado automaticamente.

Dai veio a primeira orientação da SEED, que proibiu estes critérios acima. Não só isso: tiveram a cara de pau de falar que alunos que tivessem média de 5,6 já nem deveriam ir para conselho, sendo aprovados diretamente. Claro que também se o aluno for reprovado em conselho, o professor responsável é obrigado a preencher um mundo de papéis. A orientação trazia outros detalhes, mas na prática foi um “aprova geral”.

Este ano tivemos uma nova orientação. Desta vez, não tiveram coragem e falar que alunos com média 5,6 poderiam passar sem conselho. Mas detalharam que os professores devem avaliar exatamente qual o conteúdo da disciplina o aluno não aprendeu, e se esse conteúdo não for pré-requisito para novos temas nas séries seguintes, deve ser aprovado em conselho.

Isso quer dizer que várias disciplinas deixam de ter importância, pois não poderão mais reprovar aluno. Por exemplo Geografia, História, Biologia, Artes, vários tópicos de Ciências, de Química e de Física, entre outros. Não entendeu?

Tomemos por exemplo Geografia. No primeiro ano do ensino médio, o aluno deve aprender – entre outros conteúdos – sobre o sistema solar e sistema sol-lua-terra. Este conteúdo é importante para o aluno entender conceitos como as estações do ano, clima no planeta, marés, migração de animais, ecossistemas, e alguns outros mais. Mas não é base para mais nenhum outro tópico de geografia, em todo o ensino médio.

Portanto, se um aluno não aprender nada deste assunto, pode zerar em todas as suas atividades, ir para conselho de classe, e ainda assim ser aprovado. Portanto fica a pergunta: pra que ensinar isto?

Parece que no entender da secretaria da educação, é um conhecimento que não serve para nada.

Concluindo, acredito que o sistema educacional como está deve sim ser repensado e reestruturado em sua raiz, mas tenho muito medo de quem seria o responsável por essa reestruturação, pois os “especialistas em educação”, lotados na Secretaria da Educação, que deveriam ser os primeiros a propor melhorias sérias não estão acertando muita coisa.

Please follow and like us:

Administrador

Há 42 anos trazendo para você leitor informações sobre a Lapa e região. "O pequeno grande Jornal".
Entre em contato com Administrador: tribunalapa@gmail.com