O Brasil vive início de nova fase. E, como sempre, de esperança, mudança, melhora. Governo novo, novas mensagens, promessas repetidas que geram natural expectativa.
Porém, é conveniente não esquecer que a verdadeira mudança, positiva e duradoura, depende de um conjunto de fatores, de atitudes e ações. Não depende apenas do governo, da oposição, da política, da sociedade organizada. O anseio de um período melhor será realidade se todo esse conjunto atuar com sinceridade e determinismo, focado prioritariamente no bem-estar da Nação e de seu povo. Mudança deve ser vontade geral.
É importante lembrar que momentos como este o país viveu muitos outros, com maior ou menor euforia. A história registra e nossa memória sabe que a expectativa resultou mais em frustração do que confirmação.
Estamos realmente diante de nova oportunidade de reconstruir o país, segundo palavras do presidente eleito em seu discurso de posse no Congresso. É evidente que a reconstrução não se restringe a atos e políticas administrativas, seu espectro é mais abrangente.
Jair Bolsonaro chegou ao poder por uma série de peculiaridades, mas certamente a pregação centrada na necessidade de mudanças teve peso maior. Além disso, ele soube aproveitar a força das redes sociais, principalmente na fase mais aguda da campanha, quando convalescia. Ainda assim não perdeu contato nem se distanciou do eleitorado. As redes supriram com eficiência os horários no rádio e na televisão, reiterando que esta eleição foi, sem dúvida, de intensa participação popular tanto no primeiro como no segundo turno.
Bolsonaro não é efetivamente um grande líder, talvez mais um mito, como acabou sendo seguidamente qualificado. Revelou em suas propostas (algumas polêmicas) pontos identificados com os anseios populares. Sua pregação sobre mudança política e contra as velhas práticas obteve resposta e foi responsável pela rejeição a líderes desgastados e caciques partidários, ensejando uma relativa renovação.
Seu partido (PSL), carente de quadros, acabou elegendo por impulso do nome do candidato presidencial muitos nomes de pouca expressão que correm o risco de pagar pelo noviciado aderindo aos viciados caciques sobreviventes.
Entendo que um pacto, como citou o novo ministro da Casa Civil, ou movimento de reconstrução de um novo Brasil é mais complexo do que simples propostas ou retóricas políticas. Deve ser um sólido projeto em favor do país, congregando todas as forças políticas que pregam a instauração de uma nova era. Isso exige determinação, a começar pelo novo governo, entendendo que a disputa acabou e que não deve existir o lado que ganhou nem o que perdeu. O objetivo é o país, acima de picuinhas e revanchismo.
Ponto importante quando se pretende entendimento é o respeito mútuo. Não se coadunam com postura respeitosa atos e declarações impertinentes como, por exemplo, partidos que se recusaram em participar da solenidade de posse, fato que não se traduz em protesto, mas sim radicalismo e inconformismo, pois na democracia é preciso saber ganhar e perder e, portanto, evitar atitudes mesquinhas. Igualmente, do lado vitorioso ocorreram declarações inoportunas, chacotas com propósito de ridicularizar, deslustrando o sentido da conquista. Isso tudo alimenta hostilidades no momento de serenar os ânimos e demonstrar grandeza política de parte a parte.
A oposição deve compreender seu importante papel e demonstrar consciência de seus limites. A democracia não prescinde da oposição, para que exista contraponto, fiscalização, cobrança do governo, assim como colaboração em projetos e políticas do interesse nacional. Portanto, deve ter espírito colaborativo sem radicalização. Creio que o papel de oposição mais efetiva caberá ao Partido dos Trabalhadores, que não saiu diminuído da eleição. Continua sendo a grande e coesa sigla integrada por lideranças de peso como intelectuais, pensadores, representantes da cultura, artistas.
Também de outros partidos e blocos no Congresso espera-se atuação no mais amplo sentido da política como ciência da boa administração pública, reconquistando esquecidos valores éticos e patrióticos. A aplicação da cláusula de barreira resulta positiva para a futura relação governo-parlamento ao reduzir em 14 o número de partidos nanicos.
Acredito que é possível ver as prioridades do povo brasileiro colocadas acima dos desejos personalistas, ideologias partidárias, convicções pessoais. A Nação, como ente, desconhece ideologias a não ser aquela de identificar seus representantes unidos na tarefa de crescimento e bem-estar de seu povo.
Por oportuno, vale ressaltar que a maioria dos enunciados aqui descritos serve igualmente a Estados, notadamente naqueles em que houve alternância partidária e ideológica no comando central.
Resumindo, se o clima e a oportunidade são propícios à reconstrução, que a tomada de posição seja geral. Se assim não for, fica tudo como estava. Será mais uma oportunidade perdida e o Brasil, mais uma vez, o país do futuro e da esperança, não o país do presente, dos avanços e das realizações.
*Luiz Carlos Borges da Silveira é lapeano, empresário e ex-Ministro da Saúde.